não fui a mão que semeou

não fui a mão que semeou,
sou somente a mão que colhe
quando o sol arredonda os limões e lhes dá aquela cor de
primavera renovada.

um aroma cítrico perfuma o ar
se calha ao vento sacudir as folhas.
há frutos que se estendem para a minha mão,
há outros que se esgueiram lá no alto
e esses ficarão para os pássaros ou os vermes
quando por fim cairem na terra.

é o tempo das camélias, que pomposas
e solenes se adiantam por entre a folhagem.
o tempo do retorno das andorinhas, do rabirruivo,
dos assaltos dos melros aos caracóis distraídos,
da visita das pegas descaradas.

estendo a minha mão ao limão d’ouro, quase um sol
que me pesa e me cabe no colo.
e com reverência esta mão colhe
tudo o quanto não semeou.

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